Um forma diferente de entender o ciúme





Ela tinha a beleza tranquila da maturidade.

Alguns fios de cabelo branco davam ao seu rosto um encanto especial.

De hábitos domésticos e simples, um de seus prazeres era assentar-se numa poltrona e entrar na bolha que a leitura cria.

Quem lê está num outro mundo, muito distante.

O marido a observava de longe. Olhos que observam são aqueles que olham quando o outro não está olhando. Seu olhar era o de apaixonado que desconfia, olhar de ciúme. Os olhos do ciumento vigiam.

Vigiam gestos, movimentos, horas, sorrisos.

Vigiam porque as modulações silenciosas e distraídas da pessoa amada podem conter revelações sobre aquilo que ela esta pensando.

O ciumento suspeita que o ser amado lhe esconda alguma coisa.

Olha na esperança de ver algo escondido, de entrar dentro do segredo do outro. O ciumento detesta os pensamentos.

Por mais que os vigie, eles estão além de sua vigilância.

Ele queria adivinhar seus pensamentos.

E a sua vigilância se exacerbava quando ela sorria ou ria.

Como explicar este sorriso se ele, o marido, não estava dentro do livro?

Ela não precisava dele p'ra ser feliz.

Porque ali, mergulhada no livro, o marido não 'existia'...

O ciúme nasce quando se toma consciência de que a pessoa amada é livre. Ela é um pássaro pousado no ombro.

Nada o prende. Pode voar quando quiser.



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